sexta-feira, 26 de abril de 2019

KILKELLY, IRLANDA (Quinta Parte)




Kilkelly, Irlanda, 1892.
John, meu irmão querido:
desculpa não te ter escrito mais cedo
contando que o pai havia falecido.
Vivia com a Bridget, ela disse que esteve
alegre e saudável até a sua hora chegar.
Devias tê-lo visto com os netos do teu amigo 
Pat McNamara: nunca paravam de brincar.
Sepultá-mo-lo no pátio da igreja de Kilkellly,
ao lado da nossa mãe, sua esposa querida.
O pai era um velhote rijo e bem vivaço, 
considerando o quão dura lhe foi a vida.
Engraçado como não parava de falar em ti,
próximo do fim pelo teu nome ouviu-se chamar.
Porque não pensas em fazer-nos uma visita?
Todos nós gostaríamos outra vez de te abraçar.






Peter Jones.








(Versão de Pedro Belo Clara a partir do original em inglês.)










(Agora que se finda esta série de cinco publicações, deixamos ao estimado leitor a habitual sugestão musical. Desta vez, escolhemos a belíssima versão, segundo o nosso parecer, claro está, que Robbie O'Connell fez do tema, tornando-a provavelmente na mais divulgada e, por isso, conhecida interpretação. Se será ou não a mais bem conseguida, isso deixaremos ao critério de quem a quiser escutar. Aqui fica o vídeo da dita versão, com diversas fotografias de época a ilustrá-lo: https://www.youtube.com/watch?v=Mq8FASqnohU .)










(Nota: É possível consultar todas as cartas que estiveram na origem desta canção. Quem o desejar fazer, poderá visitar o seguinte site: https://www.irishcentral.com/homepage/the-moving-letters-of-a-family-to-their-son-in-america-after-the-famine . 
Com um pouco de tempo e paciência, notar-se-á que muitos detalhes foram compreensivelmente ocultados na história que se canta, nomeadamente a morte duma outra irmã, de seu nome Mary. Como já se sabe, apenas Bridget é referida na canção, mas na última carta que sobreviveu ao tempo, datada de 1892, e onde já se faz nota ao falecimento do pai, é ainda possível encontrar um esclarecimento sobre a morte dessa outra irmã, falecida após «três dias em que esteve na cama, doente.»
Não se torna totalmente claro se John voltou ou não à Irlanda. Também não se sabe porque se interrompeu a correspondência. Uma nova morte? Cartas posteriores que se perderam no tempo? Apenas se poderá conjecturar, mesmo que seja elevado o grau de probabilidade de John não se ter reencontrado com a sua família na ilha natal. 
Em todo o caso, o testemunho que fica imortalizado nesta bonita balada apresenta uma dimensão humana profunda, servindo de exemplo das múltiplas vivências de irlandeses imigrados na América: o trabalho nos caminhos-de-ferro, casamento e filhos vários, ligeira melhoria de condições de vida, a saudade dos que ficaram para trás, a morte dos familiares ainda na terra natal e o quase provável não regresso ao país de origem. Por tudo isto, é natural que este tema fale muito intimamente a cada irlandês, dado ser uma prova viva dum passado tão árduo e difícil de esquecer.)
















(The Old Man Reading A Letter, 
de Fyodor Bronnikov (1827 - 1902))






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