sexta-feira, 29 de abril de 2022

A DONZELA DE LLYN-Y-FAN (1ª Parte)


Há muito, muito tempo, no condado de Carmarthen, no sul de Gales, vivia um homem e a sua mulher numa pequena quinta. Porém, o homem morreu numa batalha e, com ele, morreram também três dos seus quatro filhos. A viúva fez tudo para proteger o único filho que lhe restava e ensinou-o a cuidar da quinta e a tratar do gado, para que ficasse longe das guerras. O rapaz, que se chamava Gwyn, tornou-se no melhor agricultor e pastor da região e, quando cresceu, tornou-se um homem belo e robusto. 

Um dia, Gwyn levou o seu gado até às margens do lago Llyn-Y-Fan¹, onde a erva era mais tenra e saborosa. Sentou-se junto ao lago e acabou por adormecer. No seu sonho ouviu uma voz doce e melodiosa que, convidando-o a olhar para o lago, acabou por acordá-lo. Gwyn esfregou os olhos e ficou estupefacto quando viu, sentada na superfície do lago, a mulher mais bela do mundo. A sua pele era tão branca como a espuma das ondas, os seus olhos mais azuis do que a mais azul das flores, a boca mais vermelha do que a flor da dedaleira e o cabelo tão louro e brilhante que reflectia a luz do sol. A mulher estava a pentear o cabelo com um pente dourado, utilizando a superfície do lago como espelho. O dia estava tão límpido e claro que a sua imagem reflectida na água parecia real, e Gwyn ficou, de imediato, perdidamente apaixonado por aquela mulher tão bela. Devagar, com medo que ela se afastasse, aproximou-se da água e ofereceu-lhe o pão e o queijo que a sua mãe lhe tinha mandado para o lanche. Ela abanou a cabeça a recusar a oferta e dos seus lábios saiu a mesma voz que Gwyn ouvira no sonho:

Muito duro é o teu pão,
esperarás por mim em vão.

Assim que acabou de proferir estas palavras, mergulhou nas águas do lado e desapareceu. 

Gwyn ficou desolado e esperou pelo final do dia junto ao lago, na esperança de que ela voltasse a surgir. Mas isso não aconteceu e o jovem regressou a casa, triste e cabisbaixo. Ao vê-lo naquele estado, a mãe perguntou-lhe o que o afligia e ele contou-lhe tudo o que se tinha passado. Então, concordou que o pão que lhe tinha mandado era duro, e logo se apressou a cozer um outro com uma massa diferente, para que saísse mais tenro. 

No dia seguinte, Gwyn voltou ao lago com o pão e esperou impacientemente que a donzela aparecesse. As horas foram passando sem que nada acontecesse, mas, quando o jovem estava prestes a regressar a casa, a donzela reapareceu à superfície do lago a pentear os seus longos cabelos louros. Parecia ainda mais bela do que no dia anterior e Gwyn sentiu um nó na garganta. Ainda assim, conseguiu dizer-lhe: 

Senhora, há alguma coisa que possa fazer para que saias desse lago e venhas viver comigo?

E ofereceu-lhe o pão que levava consigo. Mas, mais uma vez, ela recusou o pão, afirmando:

Muito tenro é o teu pão,
não terás o meu coração.

E, dito isto, desapareceu de novo nas águas límpidas do lago. 

O jovem voltou a contar tudo à mãe, que lhe disse que, de facto, tinha cozido mal a massa do pão e que, por isso, ela tinha ficado demasiado tenra. Nessa noite, a viúva preparou nova massa e cozeu-a à temperatura ideal, de modo que o pão ficou com a consistência perfeita.


(Continua...)





(Conto extraído de "Os Tylwyth Teg ou Povo Belo", provavelmente originado no século XIII.)









(Tradução de Angélica Varandas in "Mitos e Lendas Celtas do País de Gales", Clássica Editora, 2012.)









(1) O Llyn-Y-Fan-Fach é um lago com certa de dez hectares, situado no condado de Carmarthenshire, no sul do País de Gales. Encontra-se na margem norte da Montanha Negra, actualmente incluído no Parque Nacional Brecon Beacons.










("Lady of The Lake",
de Astrid Bruning)